Tudo na vida é movimento. O Universo, em toda a sua magnitude, é puro movimento desde o instante em que se deu o “big bang” e as partículas de poeira cósmica formaram os corpos celestes, no transcurso milenar do tempo. Os planetas orbitam em torno de seus sóis e de si mesmos, obedecendo ao imperativo das leis de rotação e translação. Os cometas vagam indefinidamente pelo cosmos, viajando longas distâncias no cumprimento de órbitas seculares. Os asteróides flutuam pelo espaço, mergulhados no éter e atraídos pela força gravitacional de corpos maiores.
Os cinco continentes, antes Pangéia, fazem a incansável viagem da deriva continental, navegando sobre o magma das profundezas ígneas da Terra. Os oceanos e mares se agitam em vagas que quebram na praia, ora impetuosas, ora suaves, a beijar o litoral. As correntes marítimas circulam o planeta. Os regatos e córregos juntam-se aos rios e correm para o mar. As nuvens se agitam ao sabor dos ventos. Estes, ora Alísios, Siroco, Monções, Minuano… sopram aqui, ali, acolá, levando consigo as areias retirantes.
As plantas, presas ao solo, encontraram forma inteligente de migração e perpetuação das espécies, lançando seus germens fecundos ao vento ou servindo-se de seres alados para dispersá-los no solo fértil, que acolhe e nutre a semente.
As aves migram de acordo com a sazonalidade, voando longas distâncias, atravessando continentes e mares. Os peixes, na luta instintiva pela preservação, nadam em cardumes pelos oceanos sem fim, pelos rios caudalosos e remansos. As manadas cruzam savanas, serrados, selvas e florestas atendendo ao apelo da sobrevivência.
Os grandes mamíferos deslocam-se na terra e na água em busca de ambiente ideal para procriação e alimentação. Os quelônios nascem para a vida e para o compromisso de retornar ao berço onde rebentou do ovo, após milhas de natação.
Em escala menor, agitam-se os átomos e trocam partículas os elementos da tabela periódica. Fundem-se essas substâncias dando origem a outras tantas e estas, subsídio à vida, como o oxigênio, hidrogênio, carbono, nitrogênio, entre outras.
No homem, esse universo em miniatura, a vida pulsa no ritmo do movimento cardíaco que faz fluir o sangue desde as grandes veias até os alvéolos, onde ocorre a hematose, e destes até a aorta que lhe inunda o corpo com a linfa rediviva e escarlate. Parte desse concerto da obra chamada vida, o homem não age diferente. Motivado pela sede de saber, descobrir e conhecer lança-se, desde tempos imemoriais, às aventuras ora propícias, ora bizarras. Ora por necessidade, ora por curiosidade. Desde que deixou de ser antropóide ou simples primata para se tornar homo erectus, iniciou a sua marcha, registrando pegadas nos solos que comprimia, deixando marcas de sua passagem e de seu modus vivendi.
Esse homem, insaciável, mal descido dos galhos, põe-se a vagar pelos arredores de sua gruta, caçando, matando e acumulando experiências para andanças mais significativas. De objetos toscos constrói suas ferramentas rudimentares, protótipos primevos daquelas que o auxiliariam na arquitetura e engenharia que lhe dariam os meios de morar, deslocar, sonhar e realizar viagens antes inimagináveis.
Ao calor do fogo que aquecia e protegia, dormia o gigante humanóide para despertar de sono errático como homo sapiens sapiens, trazendo de seus sonhos as lembranças que o fizeram romper a gravidade e erguer-se no ar, encurtando distâncias e desvendando o infinito com telescópios, sondas e espaçonaves tripuladas. Essa inquietude fê-lo conquistador. Conquistador de sua terra, construtor de sua cultura autóctone.
Descobridor da agricultura, finca seus pés e se estabelece próximo à água. Treinado nos embates contra a fome, que lhe exigia perícia de caçador, veste-se de escudos e se arma de lanças e espadas para servir nos grandes exércitos de Akhen-Aton, Ramsés, Carlos Magno, Ciro, Dario, Alexandre, Aníbal, Julio Cezar, Constantino, Giuliano, Kublai Khan, Napoleão e outros mais, para vagar pelas paragens dantes desconhecidas, mas impregnadas de desafios.
Para servir aos seus impulsos de riqueza fácil, nações motivadas pelo reluzir do ouro e da prata, pelo valor das gemas extraídas das entranhas da terra e pelo perfume rico das ricas especiarias, cruzam fronteiras e singram oceanos, para revelar aos seus olhos as terras de além mar.
Tanto esforço para expandir as fronteiras imperiais não ficou indiferente e foi registrado pelos olhos observadores de Heródoto, Diodoro, Éschylo, Vitrúvio, Xenofontes, Plínio, Cícero, Ovídio, Flávio Josefo e outros mais atuais. Era o homem perpetuando a história itinerante do homem. Era o homem registrando-lhe os passos, nem sempre acertados e nem sempre justos, na direção da vendeta, matando e pilhando em nome do seu império e de seus deuses. Nada diferente de tempos atuais.
Era o homem registrando nos papiros e pergaminhos os feitos desse mesmo homem, inquieto por natureza, para, em tempos vindouros, servir-lhe de subsídio nos estudos e pesquisas que buscam definir a si, o seu ancestral.
Herdeiro de si mesmo, esse ser, o homem, irrequieto e migratório como ave de arribação, cuja história individual e coletiva se perde na caligem dos tempos, no transcurso dos quais muitas habitações ocupou, carece fazer-se consciente, percebendo-se como algo mais que matéria dotada de intelecto, para se reconhecer Espírito de razão.
Dessa forma, faz-se consciente de sua imortalidade e ciente de que é responsável por suas escolhas, acorda-se de si para viver em si e a si imprimir a força da ética e da moral que lhe propicia a oportunidade de se reconstruir a cada dia, transmigrando-se e se transformando pelas experiências edificantes e redentoras. Estas experiências, nem sempre fáceis, contudo, necessárias, exigem-lhe reparação de seus erros, para se pôr quite com a Justiça Divina e tranqüilo ante sua consciência.
Assim se processa a vida em essência que, parte da dinâmica universal, não poderia fugir à regra, mas conspirar para sua comprovação. Na natureza nada se cria, mas por si se transforma sem se perder indivíduo constituído múltiplo pelas experiências acumuladas, contudo, migrando de estratos evolutivos, na direção do cosmos infinito, a habitar uma das moradas redimidas criadas pelo Pai.